sexta-feira, 24 de junho de 2016

Gato: o animal ideal do século XXI

Sagrado no Egito Antigo e perseguido na Idade Média, o gato deve assumir o posto de bicho mais popular do mundo neste século. A chave para compreender suas múltiplas faces é a ciência, afirma o biólogo britânico John Bradshaw

Gato com novelo

“Gatos e cachorros apelam a diferentes partes da natureza humana. Os gatos oferecem um vislumbre da vida selvagem, enquanto os cachorros oferecem lealdade e submissão” John Bradshaw, biólogo
              Em 13 de junho de 1233, o papa Gregório IX definiu o que era um gato. No documento oficial Vox in Rama, o gato preto foi descrito como “encarnação do demônio”. Antes disso, no Egito Antigo, o animal tinha status de sagrado. Em um passado ainda mais longínquo, o gato foi domesticado com uma única função, caçar ratos – e esse era o motivo de mantê-lo em casa até poucas décadas atrás. Como um bicho com tantas “encarnações” na história transformou-se naquele que deve se tornar o mais popular do século XXI? “Gatos intrigam a humanidade desde que passaram a viver entre nós. A chave para compreendê-los está na ciência”, afirma o biólogo John Bradshaw, pesquisador da Universidade de Bristol, na Inglaterra.
               Em seu livro Cat Sense (Sentido do gato), lançado em setembro de 2013 nos Estados Unidos e inédito no Brasil, Bradshaw usa as últimas pesquisas científicas para explicar o comportamento dos bichanos e defender a tese de que eles são os companheiros ideais para o homem da atualidade.
               Ainda existem mais cachorros do que gatos no mundo: são 335 e 260 milhões, respectivamente, segundo a consultoria de mercado internacional Euromonitor, em uma estatística de 53 países. Mas a população felina cresce mais do que a canina e, em nações como Estados Unidos, França e Alemanha, já é maioria. No Brasil, de acordo com a Associação Brasileira de Indústria de Produtos para Animais (Abinpet), vivem 37 milhões de cachorros e 21 milhões de gatos. Na proporção em que aumentam nos últimos anos – duas vezes mais do que os cães – os bichanos devem assumir a dianteira do ranking daqui a dez anos, segundo a Abinpet.
          Ainda existem mais cachorros do que gatos no mundo: são 335 e 260 milhões, respectivamente, segundo a consultoria de mercado internacional Euromonitor, em uma estatística de 53 países. Mas a população felina cresce mais do que a canina e, em nações como Estados Unidos, França e Alemanha, já é maioria. No Brasil, de acordo com a Associação Brasileira de Indústria de Produtos para Animais (Abinpet), vivem 37 milhões de cachorros e 21 milhões de gatos. Na proporção em que aumentam nos últimos anos – duas vezes mais do que os cães – os bichanos devem assumir a dianteira do ranking daqui a dez anos, segundo a Abinpet.
                 O motivo pelo qual gatos não são leais e obedientes como os cachorros é evolutivo. Domesticados há cerca de 11 000 anos, na Europa, os cães foram sendo moldados pelos homem. Aqueles que exibiam características mais úteis ao convívio humano – capacidade de caçar, pastorear rebanhos, defender territórios, fazer companhia – foram acolhidos, passaram sua herança genética adiante e são os ancestrais dos que conhecemos atualmente. Já os gatos começaram a morar dentro de casa há cerca de 4 000 anos, no Egito – embora convivam com o homem há aproximadamente 10 000 anos.
Bradshaw diferencia gatos totalmente domesticados – aqueles que têm a reprodução controlada pelos humanos, como os com pedigree, minoritários – dos de rua, que se reproduzem sozinhos e têm o comportamento semelhante aos selvagens. Nas próximas décadas, com a intervenção humana na criação de novas raças adaptadas à vida doméstica contemporânea, os gatos provavelmente abandonarão algumas de seus traços selvagens. “Os gatos foram domesticados pela única razão de controlar o número de ratos. Interessava manter o seu comportamento selvagem”,disse Bradshaw. Hoje eles são principalmente um animal de estimação, e acredito que ainda neste século seu processo de domesticação será completado.”

Caça aos gatos

O economista neozelandês Gareth Morgan propõe a eliminação dos gatos no país. O motivo: salvar dezenas de espécies de pássaros nativos da extinção


gato

No final do século 19, a pequena Ilha Stephens ainda era um ambiente completamente isolado do resto do mundo. Localizada entre as duas grandes ilhas que formam a Nova Zelândia, sua exuberante natureza permanecia intacta quando o biólogo David Lyall passou a cuidar da manutenção de um farol recém-construído no local, tendo como única companhia um chamado Tibbles. Enquanto o dono trabalhava, o animal começou a explorar o novo ambiente e não demorou a aparecer no farol com pequenos pássaros mortos em sua boca, resultado de caçadas diárias.
Um desses pássaros era diferente de todos que Lyall já havia visto: media cerca de dez centímetros, com coloração verde escura e pontos amarelos pelo corpo. Tratava-se de uma espécie completamente nova, com uma característica rara: era um passarinho incapaz de voar. Isolada durante milhões de anos na ilha, a espécie nunca havia precisado enfrentar um predador – até Tibbles aparecer. O gato levou cerca de dez cadáveres da ave até o farol. Depois disso, ela nunca mais foi vista. A espécie, que ficaria conhecido como cotovia da Ilha Stephens, estava extinta. É o único caso que se tem notícia de toda uma espécie ser extinta pela ação de um único animal: um gato doméstico.
Mais de um século depois, as caçadas de Tibbles ficaram para a história. No entanto, a Nova Zelândia ainda é palco da mesma batalha: um exército de gatos domésticos caça, mata e devora aves raras à beira da extinção. Segundo uma pesquisa publicada na revista Global Change Biology, os felinos já contribuíram para a extinção de nove espécies de pássaros nativos. Hoje, são 33 espécies ameaçadas pelos gatos. Com a alegada intenção de preservar preservar a biodiversidade local, o economista neozelandês Gareth Morgan apareceu com uma proposta radical: eliminar os gatos da ilha. “Temos de tornar a Nova Zelândia um ambiente livre de predadores. Eu defendo um ataque aos gatos que estão soltos pelo país – eles estão destruindo nossa vida selvagem”, afirmou Morgan.
Jogo de gato e rato – Gareth Morgan é um milionário que passou boa parte de sua vida trabalhando em bancos e instituições financeiras da Nova Zelândia – ele já foi considerado a décima pessoa mais importante do país por uma revista local. Em 2006, ele deu início à Morgan Foundation, uma instituição de caridade voltada a ajudar os pobres, incentivar a comunidade local e preservar a natureza do país. O novo alvo da fundação são os gatos.
No início deste ano, o grupo deu início a uma campanha chamada Cats to Go. A premissa é simples: os gatos soltos devem ser banidos do país. Se um habitante da ilha quiser ter um gato, ele deve manter o bichano dentro de casa, castrado e confinado 24 horas por dia. “Se você não for capaz de manter o animal dentro de casa, deve considerar a possibilidade de este ser seu último gato”, diz Morgan.
O economista propõe que cada animal com dono receba um microchip. Se forem vistos na rua, serão devolvidos para sua casa e seu responsável receberá uma multa. Já os gatos de rua, sem nenhum dono ou registro, seriam capturados, enviados para o governo e sacrificados. “Obviamente, eles seriam mortos de maneira absolutamente humana”, afirma. Morgan garante que, desse modo, em apenas uma geração os gatos estariam eliminados do país – e os pássaros livres para viver, se reproduzir e repovoar as florestas locais.
Fera felina – A Nova Zelândia é conhecida por sua biodiversidade única. Isoladas do resto do mundo por imensos oceanos, as ilhas que formam o país foram o ambiente ideal para o surgimento de novas espécies de insetos, pássaros, anfíbios e répteis. Sem ter de enfrentar nenhum tipo de mamífero predador, algumas aves locais, como o kiwi, um dos símbolos nacionais, não chegaram nem a desenvolver a habilidade de voar. Com a chegada dos humanos no século 13, e o consequente fluxo de cães, gatos e ratos, a carnificina foi enorme. Hoje, cerca de 40% das espécies nativas de pássaros estão extintas, e 37% das que sobraram estão em risco de extinção.
Ao mesmo tempo, a Nova Zelândia também é o país com o maior numero de gatos por pessoa no mundo. Mais de 48% das casas têm um ou mais felinos de estimação – ao todo, são mais de 1,4 milhão no país. Para os donos, eles representam uma companhia valorosa. São animais dóceis e carinhosos, que vivem em harmonia com os seres humanos há mais de 9.000 anos. No entanto, longe das vistas humanas, eles se revelam um eficiente predador. O mesmo estudo publicado na revista Global Change Biology diz que eles já contribuíram para 14% das extinções modernas de pássaros, mamíferos e répteis.
Segundo outra pesquisa, publicada nesta semana na revista Nature Communicationsos gatos domésticos são responsáveis pela morte de entre 1,4 e 3,7 bilhões de pássaros todos os anos nos Estados Unidos. O perigo, no entanto, é global: a União Internacional para a Conservação da Natureza considera o gato doméstico uma das cem piores espécies invasivas do mundo.

Em dez anos, os brasileiros vão preferir gatos a cachorros

SINAL DE RIQUEZA - Quanto mais gatos domésticos existem, melhor o país

Na corrida pelo coração do homem, os cachorros largaram na frente. Os primeiros lobos, ancestrais dos cães que conhecemos, foram domesticados há 100.000 anos. Eles se aproximaram dos acampamentos em busca de restos de alimentos. Seus filhotes ganharam abrigo e foram escalados para ajudar nas caçadas. Os gatos só entraram no nosso convívio bem depois, há 4 000 anos, no Egito. O trabalho deles era comer os ratos que se infiltravam nos depósitos de comida. Nas sociedades modernas, o cachorro manteve a primazia e ganhou o título de melhor amigo do homem, mas uma revanche dos felinos já está em andamento. A expansão e o enriquecimento das cidades e as mudanças demográficas fizeram com que o número de felinos crescesse aceleradamente em vários países. Nos Estados Unidos, na França e na Alemanha, a população de gatos já é maior que a de cães. No Brasil, a virada deve ocorrer daqui a dez anos, pelos cálculos da Associação Brasileira da Indústria de Produtos para Animais de Estimação (Abinpet). “Em 2022, para cada cachorro que for visto passeando na rua de coleira, haverá um gato dentro de uma casa”, diz o engenheiro agrônomo José Edson Galvão de França, presidente executivo da Abinpet.


Gatos: 9 atitudes dos donos que os felinos detestam

Seu gato não gosta de viajar, ou que você mude os móveis da casa? O motivo pode estar nos ancestrais dos felinos

Gatos

Para garantir bom relacionamento com os gatos, especialistas acreditam que os donos devem conhecer a história evolutiva desses típicos felinos que, mesmo domésticos, ainda cultivam muitos dos instintos selvagens. 

A quantidade de lares que adotou o gato como o animal da casa está aumentando – não à toa: os bichanos são defendidos por alguns especialistas como John Bradshaw, pesquisador da Universidade de Bristol, na Inglaterra, como o animal ideal do século XXI. Mas, para garantir um bom relacionamento, especialistas acreditam que os donos devem conhecer a história evolutiva desses felinos que, mesmo domesticados, ainda cultivam muitos dos instintos selvagens.
Se seu gato não gosta de viajar ou que você mude os móveis da casa, por exemplo, o motivo pode estar no passado territorial e caçador dos peludos: a maioria desses felinos vê mudanças como uma ameaça. “Os gatos podem viver mais felizes quando compreendemos o seu comportamento. Eles não são selvagens, mas muitas das atitudes que tomam hoje têm origens claras nos felinos ancestrais”, diz Carolina Rocha, mestre em comportamento animal pela Universidade de São Paulo (USP), ao site de VEJA.
Gatos antigos – Estima-se que os bichanos se mudaram para perto das cidades povoadas para se alimentar dos roedores há 10.000 anos, iniciando a convivência com humanos – que, ao perceberem a redução dos ratos na cidade, provavelmente incentivaram a permanência dos felinos. Mas os felinos ainda percorreram um longo caminho até conseguirem entrar nos lares das pessoas como animais de estimação: a domesticação ocorreu apenas há 4.000 anos no Egito.
Diferentemente do cão, que vem sendo moldado por humanos há 14.000 anos, a domesticação tardia dos felinos fez com que eles mantivessem até hoje muitas das suas características selvagens. Os gatos no século XXI buscam aliar caça e companheirismo – por isso não é raro que o bichano presenteie o dono com qualquer outro animal morto.